“Foi um presentaço. Na linguagem, assim, parapsicológica, não sei como a gente pode determinar. Foi um presente que os deuses do teatro me deram”.
Assim, o ator Osmar Prado, de 77 anos, define o seu sentimento em relação à peça O Veneno do Teatro, que estreia nesta sexta-feira (14) a terceira temporada no Rio de Janeiro. Dessa vez, o palco será o do Teatro Municipal Carlos Gomes, na Praça Tiradentes, centro do Rio, onde ficará em curta temporada até o dia 6 de abril. As outras encenações foram no Teatro Firjan Sesi Centro e no Teatro PRIO, no Jockey Club, na Gávea, zona sul da cidade.
Na montagem, Osmar Prado interpreta um excêntrico Marquês ao lado do ator Maurício Machado, que dá vida a Gabriel De Beaumont, um ambicioso e famoso ator. A relação dos dois começa com um convite do Marquês para Gabriel interpretar uma peça teatral de sua autoria. Por meio de um jogo psicológico, o autor passa a controlar o ator, que conclui estar em uma armadilha, em que será submetido a um experimento onde os limites de realidade e ficção se confundem. O público se envolve com a história que, após muitas surpresas, apresenta um Marquês psicopata capaz de qualquer coisa para atingir seus objetivos.
“Tenho orgulho de fazer o marquês, o psicopata, porque o marquês é o poder absoluto. Então, eu faço o poder absoluto”, apontou Osmar Prado em entrevista à Agência Brasil, reconhecendo a importância de trazer ao público um personagem com essas características.
“É um texto que é um presente para nós, mas, acima de tudo, um presente para o público que ama teatro, e que vai ficar em dúvida se tudo aquilo também é realidade ou ficção, e para todas as pessoas também que nunca foram ao teatro e vão ver um grande espetáculo”, celebrou Maurício Machado à Agência Brasil.
Convite
Osmar recebeu o convite do diretor Eduardo Figueiredo para fazer O Veneno do Teatro depois de ter participado da novela Pantanal, na Rede Globo, na qual interpretou o personagem Velho do Rio. Fazia dez anos que não atuava em teatro, porque estava determinado a só representar caso realmente se sentisse bem na obra. “Nem sabia o que era e pedi para mandar o texto para eu ler. Falei ‘vou ver o que é essa peça e, se de fato ela bater, eu vou fazer’. Não deu outra. Ela bateu”, lembrou.
O diretor do espetáculo, Eduardo Figueiredo, disse que, quando leu o texto, o primeiro nome que lhe veio à cabeça para interpretar o marquês foi o de Osmar Prado.
“É uma personagem que exige muito o trabalho de ator. Precisava ser um grande ator com vários recursos para executar. No decorrer do espetáculo, o Osmar tem três movimentos dessa personagem. O primeiro, em que interpreta um criado; depois, se apresenta como o marquês, de uma forma mais excêntrica com muito humor e é divertido; e, depois, se transforma e mostra realmente quem ele é, quem é esse psicopata que manipula o Gabriel, personagem do Maurício, e faz uma manipulação psicológica para atingir os objetivos dele. É um personagem que tem várias nuances”, relatou o à reportagem.
Escrita pelo premiado autor espanhol Rodolf Sirera, considerado um dos dramaturgos contemporâneos de maior destaque na Europa, O Veneno do Teatro já foi encenada em 62 países, sendo visto por mais de 6 milhões de pessoas. No Brasil, foi assistido por mais de 60 mil espectadores. Recentemente, reestreou na Argentina e na Espanha, repetindo sucesso de público e crítica.
Sucesso
Para Osmar Prado, o motivo de tanto interesse do público é porque o assunto que se aborda na peça é universal.
“Nós estamos enclausurados no palco pelo marquês, e a plateia no teatro está enclausurada pela clausura do marquês no palco, portanto, plateia e intérpretes no espaço teatral estão ambos enclausurados. Ou seja, não tem saída, a partir do momento que se fechou a porta de entrada do público, o público faz parte dessa clausura, dessa ameaça, dessa instabilidade emocional de forma artística que se estabelece no contexto de O Veneno do Teatro. Não existe coisa mais bela que isso quando você enclausura, somos todos reféns de uma situação”, disse. “Há uma ameaça no ar quando dá o terceiro sinal [para começo da apresentação de O Veneno do Teatro”.
Maurício Machado disse que o público acompanha a história como se olhasse pelo buraco da fechadura, em uma ação transcorre com muitas surpresas e reviravoltas, em um espetáculo impactante e hipnotizante.
“As reações que a gente tem são as mesmas em todos os lugares. É um espetáculo de muito texto, apesar de muito curto, com apenas 1h10 de duração, mas é um duelo de grandes personagens com poder muito forte de texto. Aliado a isso, tem uma grande encenação, plasticamente muito bonita, com um cenário lindíssimo que ajuda a contar a história. Com uma iluminação que é praticamente um show de rock, que deixa as pessoas completamente alucinadas neste thiller, porque é um suspense desde o momento em que se abre a cortina”,descreveu à Agência Brasil.
“Nesses 37 anos de carreira, desde o começo do advento do celular, é a primeira vez que eu faço um espetáculo que ninguém mexe no celular, não tem luzinha de celular. A gente não ouve notificação de celular. Pode ser que neste final de semana ocorra, mas até o prezado momento, não aconteceu, o que é ótimo e confere com o que eu disse. A plateia fica impactada”, observou Maurício Machado.
Embora o texto original tenha sido escrito na década de 70, após a ditadura de Francisco Franco, que governou a Espanha entre 1939 e 1975, a história da peça se passa na França, em 1784, na pré-revolução francesa. O diretor Eduardo Figueiredo disse que a montagem brasileira assumiu uma postura atemporal, inspirada na década de 1920 em Paris. Além disso, é a primeira entre as montagens já encenadas no mundo que tem música ao vivo, executada pelo violoncelista Matias Roque, com direção musical de Guga Stroeter.
“É lindo, porque é todo pontuado e dá o clima do espetáculo. Dá clima de tensão, dá o clima de leveza à cena. De todos os espetáculos que eu fiz, só dois não tinham música ao vivo. Acho que a música ao vivo sempre enriquece o trabalho. O teatro é ao vivo, então, com a trilha executada ao vivo, você tem o espetáculo essencialmente, todo ele, acontecendo ao vivo”, contou o diretor.
Osmar Prado considera que o acompanhamento de Matias Roque, com um instrumento clássico como o violoncelo pontuando cada momento do espetáculo, é nada menos que magnífico.
“Hoje, nós não poderíamos mais fazer a peça sem o violoncelo do Matias. Eu, por exemplo, em um determinado momento da peça, sem a ária da quarta corda de Johann Sebastian Bach, ─ aliás, eu menciono a quarta corda ─ eu não poderia mais fazer a cena. A música é a forma mais perfeita de comunicação humana. Você pega Tico-Tico no Fubá ou qualquer samba e toca lá no Japão ou nos confins do mundo, vai ter gente dançando. A música é a forma mais perfeita de manifestação artística”, comentou, Osmar Prado acrescentando que a inclusão da música ao vivo “foi um grande golpe teatral do Eduardo Figueiredo”.
Patrocínio
O diretor Eduardo Figueiredo revelou que a produção está buscando patrocínio para levar a montagem para teatros do Norte e do Nordeste do Brasil. “Estamos fazendo o espetáculo há mais de um ano e agora estamos também batalhando por um patrocínio para uma turnê nacional, para poder fazer regiões que a gente ainda não fez que são Norte, Nordeste e Centro-Oeste”.